A memória de Shahbaz Bhatti na homilia de dom Ambrogio Spreafico

Meditação de dom Ambrogio Spreafico

Lucas 10,1-9

Caros irmãos e irmãs
esta noite, juntamente com muitos outros e com os nossos amigos paquistaneses, estamos aqui para rezar em memória de Shahbaz Bhatti, morto por homens armados a 2 de Março de 2011, há dez anos, ao sair de casa da sua mãe em Islamabad.
Um homem desarmado e desprotegido, deu a sua vida para cumprir a sua missão: trabalhar incansavelmente pela coexistência pacífica entre as várias comunidades de um país belo e complexo, onde os cristãos são uma minoria, começando por ajudar os pobres e as minorias. Um cristão, cada cristão, é chamado a uma missão na história, de facto, como diz o Papa Francisco: "Eu sou uma missão nesta terra, e por isso estou neste mundo" (EvG, 273). Shahbaz compreendeu que a fé, alimentada pela Palavra de Deus, pode mudar a história. A Bíblia, que colocámos no altar, a sua Bíblia, foi a luz, o alimento dos seus dias, a força que lhe permitiu cumprir a sua missão com paciência e tenacidade. Também naquele dia, antes de sair, ele tinha rezado com as palavras da Bíblia. Aquela Palavra lida todos os dias está por detrás da sua missão, das suas escolhas, das suas batalhas pelas minorias e não apenas pelos cristãos, dos seus laços de amizade no Paquistão e noutros lugares, como aqueles com a nossa Comunidade durante muitos anos.

Eu também me lembro dele, humilde e em oração, na noite de 11 de Setembro de 2010, quando a Comunidade comemorava os ataques nos EUA a 11 de Setembro de 2001 nesta Basílica, um lugar de oração pela paz e a unidade. Um homem com uma missão e um sonho: o sonho de um povo reconciliado. Da sua casa o seu olhar elevava-se em direcção às montanhas, e para ele significava olhar para o futuro com esperança, acreditando que o sonho de Deus de um mundo de irmãos e irmãs podia tornar-se realidade e que ele tinha de ser o seu construtor. Desde criança começou a vivê-lo ajudando os outros, das famílias que foram vítimas de um terramoto aos muitos pobres. Ainda jovem, ele casou com o sonho de um país plural. O seu compromisso entrou nas difíceis dobras da sociedade e da política, nunca contra ninguém, mas sempre em defesa da possibilidade de todos viverem juntos em paz. Os seus laços com os líderes muçulmanos são um exemplo disso, assim como o seu testemunho fora do seu país para que o seu sonho e a sua esperança pudessem ser sustentados pela oração e pela amizade de muitos.

Shahbaz Bhatti viveu profundamente a sua identidade cristã, e ao mesmo tempo a sua missão, procurando de cada vez encontrar o outro, abrir portas ao diálogo, abrir espaço para a possibilidade de estar unidos na diversidade. Toda a sua vida foi entregue por isto. É a vida dos cristãos. Também deveria ser assim neste tempo de sofrimento e morte. Sim, "Eu sou missão", sou portador de uma Palavra que é paz e esperança. "Ide! Envio-vos como cordeiros para o meio de lobos. Não leveis bolsa, nem alforge, nem sandálias; e não vos detenhais a saudar ninguém pelo caminho. 5*Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: 'A paz esteja nesta casa!'". Jesus parece exagerado, e depois apressado, quase incapaz de compreender o que precisamos. Mas as suas palavras são verdadeiras. Há também lobos no mundo. Há tanta violência, há guerras, terrorismo, poder arrogante que esmaga os outros, especialmente os pobres. Shahbaz Bhatti sabia disso, ele sabia que eles podiam impedir o seu sonho ao ponto de o matar. Mas ele sentiu que tinha uma missão e não recuou.

Ele sabia que não havia tempo a perder atrás de si mesmos; viu pessoas a sofrer, minorias em dificuldade, apesar das aberturas que tinha conseguido obter como Ministro das Minorias. Ele sabia que a estratégia para vencer os lobos não precisava de inimigos nem de guerras, mas precisava de cordeiros, aquela mansidão que nos faz lembrar Jesus, o cordeiro de Deus que morreu para a salvação do mundo. Assim, continuou a sua missão, mesmo no meio de muitas dificuldades e ameaças, consciente de ser o portador do Evangelho da paz e da reconciliação, da não-violência. Era um homem do Paquistão, e ao mesmo tempo um homem do mundo, porque a missão do Evangelho torna homens e mulheres do mundo, para além de si mesmos e da própria particularidade. Shahbaz, nosso querido irmão, contigo rezamos ao Senhor para que nos transforme em homens e mulheres que assumam a missão do Evangelho, num mundo marcado por vezes pela falta de visões e do sonho da paz. Oremos pelos cristãos do Paquistão, pelas Comunidades de Sant'Egidio naquele país, para que no diálogo e na amizade eles possam ser um sinal de paz e amor.

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