Memória de todos aqueles que adormeceram no Senhor. Lembramos, em particular, aqueles defuntos que não são recordados por ninguém e todos os que estão no nosso coração. Leia mais
Homilia
O apóstolo Paulo exorta-nos a olhar para o futuro que está reservado aos filhos de Deus: "Vós não recebestes um Espírito de escravos para recair no medo, mas recebestes um Espírito de filhos... E, se somos filhos, somos também herdeiros", escreve aos Romanos. E acrescenta: "Penso que os sofrimentos do momento presente não se comparam com a glória futura que deverá ser revelada em nós". A memória de hoje abre aos nossos olhos um indício dessa "glória futura". Para nós que estamos aqui, esta glória deverá vir; para os que já partiram e que acreditaram no Senhor, pelo contrário, já está revelada. Eles residem naquele monte alto onde o Senhor preparou uma mesa para todos os povos. E, naquele monte, o véu "que cobre todos os povos", isto é, a indiferença que nos faz fechar em nós mesmos, para eles foi rasgado: os olhos deles contemplam o rosto de Deus. É verdade, já nenhum deles verte lágrimas de tristeza. E se no Céu há lágrimas, são lágrimas de uma doce e terna comoção sem fim. Hoje, com os olhos do coração, vemos onde estão os nossos entes queridos e para onde iremos.
Certo, estamos separados. No entanto, também há uma forte união. Não é visível aos olhos do corpo, mas nem por isso é menos real. Pelo contrário, é ainda mais firme porque não se fundamenta nas aparências exteriores, muitas vezes enganadoras e todos nós temos essa triste experiência: quantas vezes até os amigos mais chegados nos deixam sozinhos com os nossos problemas? A comunhão com os nossos defuntos está fundada no mistério do amor de Deus que a todos une e a todos ampara. A união com os nossos defuntos está fundada na Liturgia do Domingo, se assim me posso expressar. Com efeito, é ali que construímos entre nós uma ligação indestrutível. E esse laço é o amor do Senhor. Este amor é a substância da vida. Tudo passa, até mesmo a fé e a esperança. Só o amor permanece.
É o que o Senhor Jesus nos diz no trecho evangélico que acabámos de escutar. É verdade, a única coisa que conta na vida é o amor; a única coisa que fica de tudo o que dissemos e fizemos, pensámos e programámos, é o amor. E o amor é sempre grande; apesar de se manifestar em pequenos gestos como um copo de água, um pedaço de pão, uma visita, uma palavra de conforto, uma mão que aperta uma outra. O amor é grande, é forte, é irresistível porque é sempre uma faísca de Deus que inflama e salva a Terra. E felizes de nós se seguirmos as palavras do Evangelho que acabámos de escutar. No fim dos nossos dias, ouviremos dizer: "Vinde vós, os abençoados por meu Pai. Recebei como herança o Reino que meu Pai vos preparou desde a criação do mundo", e a nossa felicidade será plena.
Estas palavras são dirigidas também a nós, hoje. E elas ligam-nos àqueles que já estão no Céu. Ou melhor, diria que o Céu começa sempre que o amor se manifesta, sempre que um pobre é ajudado. É verdade, o Céu, como também o Inferno, começa já na Terra. Somos nós que começamos a construir o Inferno ou o Paraíso. Os tijolos que constroem o Paraíso os únicos que resistem à destruição da morte são os gestos de amor e de misericórdia: é aquele copo de água, aquele pedaço de pão, aquela visita a quem está doente ou na prisão, aquela boa palavra dita a quem está triste, aquela mão dada a quem está na necessidade, aquele sorriso a quem está ao nosso lado. Aos nossos olhos, estes gestos parecem pequenos e insignificantes; aos olhos de Deus são eternos. É verdade, o amor é bem mais forte do que a morte. Amemo-nos uns aos outros e o Paraíso começa já nesta Terra.