Festa de Maria Mãe de Deus
Oração pela paz no mundo e pelo fim de todas as guerras.
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Homilia
“Os pastores voltaram glorificando e louvando a Deus por tudo o que haviam visto e ouvido, conforme lhes tinha sido anunciado”. Como é possível? Olhemos para o nosso mundo. Podemos esquecer-nos das terríveis tensões que o agitam, mas elas são tão profundas que parecem não ter solução. O diálogo parece complacente e o caminho pacífico para resolver os conflitos parece demasiado frágil perante os riscos. Na verdade, são tempos difíceis os nossos. Não queremos começar o ano de maneira desmemoriada, inconsciente. Ouvimos o canto dos anjos iluminar a noite e proclamar a escolha de Deus: “Glória a Deus no mais alto dos céus e paz na terra aos homens por Ele amados”. Este amor não é fingido. É escolha, torna-se carne. Mas torna-se também risco, responsabilidade, pobreza. Também deve ser assim para nós ao olharmos para o nosso mundo. E, como uma mãe, somos levados a cobrir as feridas, a sentir apreensão pelos perigos, a procurar protecção. Deus, a quem cantamos a glória no mais alto dos Céus, tem lugar entre os homens? Terão paz os homens amados por Ele mas humilhados pelos próprios homens, que não sabem reconhecer no próximo o irmão nem a imagem de Deus? Por amor dos homens olhemos para todo o mundo e sintamos a fragilidade da convivência humana. Sintamos como insuportáveis as muitas, muitíssimas guerras esquecidas, olvidadas por um mundo rico que rejeita a dor, que se esquece, não porque não o saiba, mas porque não pára como o sacerdote e o levita da parábola. Um mundo desmemoriado esquiva os problemas. Sente-se incomodado, mas não quer e nem pode resolver nada porque isso significa compromisso, paixão, sujar as mãos.
Os Evangelhos dizem que os anjos falaram do Menino àqueles pastores, mas não é difícil pensar que também Maria o tenha feito. Certamente apresentou-O e provavelmente sem Ela eles não teriam compreendido o que se estava a passar. Maria sabia quem era aquele Filho, tanto é verdade, que com muito cuidado “conservava todos estes factos e meditava sobre eles no seu coração”. A Liturgia deste dia, com imenso afecto, exorta-nos a olhar para Maria, para festejá-l’A e para venerá-l’A como Mãe de Deus. Já se passaram sete dias do Natal, desde que os nossos olhos se pousaram sobre aquele Menino e sobre todos os pequeninos e os frágeis deste mundo. Hoje a Igreja sente a necessidade de contemplar também a Mãe e de A festejar.
É bom evidenciá-lo: contemplamo-l’A, mas Ela não está sozinha. Os pastores, mal chegaram a Belém “encontraram Maria e José e o Menino”. É belo imaginar Jesus pequenino já não na manjedoura mas nos braços de Maria: Ela mostra-O àqueles humildes pastores e continuou a mostrá-l’O aos humildes discípulos ao longo dos tempos. Maria com Jesus no regaço ou nos braços é entre todas as imagens a mais familiar e a mais cheia de amor do Mistério da Encarnação. Na tradição da Igreja do Oriente a relação entre aquela Mãe e aquele Filho é tão forte que nunca se encontra uma imagem de Maria sem Jesus; Ela existe para aquele Filho; a Sua tarefa é gerá-l’O e mostrá-l’O ao mundo. Este é o ícone de Maria, a Mãe de Jesus, mas também é o ícone da Igreja e de todo o crente: abraçar com amor o Senhor e mostrá-l’O ao mundo.
Tal como aqueles pastores que, saindo da gruta, regressaram glorificando e louvando a Deus, assim também nós, com a mesma energia e a mesma veemência, ao sairmos da celebração litúrgica, devemos entrar no novo ano que começa. E seria, na verdade, uma grande consolação se ainda hoje, alguém pudesse escrever: “Todos os que ouviam os pastores ficavam maravilhados com aquilo que contavam”. Infelizmente, as pessoas das nossas cidades surpreendem-se com outras coisas! Mas se calhar devemos perguntar também a nós mesmos se por acaso não faltam “pastores” (e não me refiro só aos sacerdotes; todo o crente é, já o dissemos, um “pastor”) que saibam comunicar às pessoas das nossas cidades a alegria do encontro com aquele Menino. “O Senhor te abençoe e guarde. O Senhor te mostre o Seu rosto brilhante e tenha piedade de ti. Que o Senhor te dirija o Seu olhar e te conceda a paz”. Façamos nossa e para todos os homens, em particular para aqueles que vivem em situações difíceis e em perigo, esta bênção de Moisés que Francisco de Assis, homem de paz, gostava de repetir aos seus irmãos. Dêmos graças por tudo a Jesus, Filho abençoado do Pai, Mestre da nossa vida que nos continua a colmatar com todos os bens. Agora e sempre.