II do tempo comum
Inicia a semana de oração pela unidade dos cristãos. Memória particular da Igreja católica.
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Homilia
João Baptista continuava nas margens do Jordão. É assim que começa o Evangelho que acabámos de escutar. Terminaram as epifanias, as manifestações do Senhor e, no entanto, João Baptista, o homem da espera, do sonho, da procura de um mundo novo, ainda está lá, nas margens do Jordão. Ele desce em profundidade, não se resigna, não reduz o Natal a um sentimento vago que deixa correr a vida como sempre. O discípulo é, decerto, um homem da Terra, tanto é que se encontra em sua casa em todos os países e é familiar de todos os homens. É este o significado de “continuar ainda” nas margens do rio. Mas estava lá para aguardar um tempo novo. De facto, o crente também é um homem do céu, isto é, um homem que aguarda pelo Reino de Deus. Não vai embora, não foge, não se resigna porque sabe que o Reino começa a manifestar-se precisamente onde ele vive. João não procura sensações novas ou um mundo virtual. Nem olha para o mundo com coração cínico, como acaba por fazer aquele que não tem esperança. Ele continua a esperar o Reino de Deus, procurando mudar o seu coração tornando-o atento aos sinais de Deus. Com efeito, precisamente enquanto ainda está nas margens do Jordão, vê Jesus a passar. Fixa o seu olhar sobre Ele. Reconhece-O e indica-O aos outros: “Eis o Cordeiro de Deus”. João Baptista escrutava com os olhos do coração os sinais de um mundo novo. E eis que vê Jesus a passar. Os seus olhos, que ele tinha treinado a escrutar os sinais de Deus, reconhecem o enviado de Deus: “Eis o Cordeiro de Deus”, diz aos presentes. É verdade, indica o Manso que com a Sua humanidade torna concreto o rosto de Deus; indica o Cordeiro que se deixa levar para o matadouro para vencer o mal; indica Aquele que responde às expectativas de felicidades, de amor, de cura, de paz, de fim das divisões.
Para André e João, é João Baptista quem indica o Senhor, Aquele de quem verdadeiramente necessitam e que lhes pode dar o sentido à própria vida. Começam a segui-l’O, se bem que de longe. Não sabemos se Jesus Se apercebe logo dos dois; o certo é que a um determinado momento, volta-Se para trás e pergunta-lhes: “Que procurais?”. Também neste caso, a iniciativa vem de Deus. É Jesus quem Se volta e “vê” os dois discípulos. No estilo do evangelista João, o uso do verbo “ver”, à volta do qual ele parece organizar toda a cena, significa que o relacionamento entre as várias personagens se processam num contacto directo, imediato: João “vê Jesus”; depois, é Jesus que “Se virou e vê” os dois discípulos e convida-os a “vir ver”; eles seguem-n’O e “vêm onde Jesus mora”; e, por fim, o Mestre “olha bem” para Pedro e dá-lhe um nome, um novo destino.
“Ver” significa descer no coração do outro e ao mesmo tempo, deixar-se perscrutar no próprio; “ver” é perceber e ser percebido. É verdade que a iniciativa vem de Deus, mas o coração dos discípulos não está vazio e nem sequer está tranquilo e satisfeito com as coisas de sempre. Isto é, os dois não tinham ficado na Galileia, na terra deles ou na cidade deles, para serem pescadores: tinham no coração o desejo de uma nova vida para eles e para os outros. E este desejo, esta necessidade provavelmente não manifestada é colhida pela pergunta de Jesus: “Que procurais?”. E eles respondem: “Rabi onde moras?”. A necessidade de ter um “mestre” para seguir e de uma “casa” onde viver é o foco da procura deles. Mas também é um pedido que provém dos homens e das mulheres de hoje, de um modo totalmente particular: com efeito, é raro encontrar “mestres” de vida, é difícil encontrar quem te queira bem deveras, pelo contrário, é cada vez mais frequente sentirmo-nos desenraizados e sem uma verdadeira comunidade que nos acolha e nos acompanhe.
As nossas próprias cidades parecem construídas para tornar muito difícil, senão impossível, uma vida solidária e comunitária. A mentalidade utilitarista e consumista, a corrida ao bem-estar individual ou de grupo, arrastam-nos todos para baixo, deixam-nos profundamente sós, órfãos e em rivalidade uns contra os outros. Há falta de “pais”, de “mães”, de “mestres”, de pontos de referência, de modelos de vida. Nesse sentido, tornámo-nos todos mais pobres e mais sós. A quem nos devemos dirigir para aprendermos a viver? Quem nos pode indicar, com as palavras e, sobretudo, com o exemplo, aquilo para o qual vale a pena viver os nossos dias? Sozinhos, não nos salvamos. Todos nós precisamos de ajuda: Samuel foi ajudado pelo sacerdote Eli, André por João Baptista e Pedro pelo irmão André. Também nós precisamos de um sacerdote, de um irmão, de uma irmã, de alguém que nos ajude e nos acompanhe no nosso itinerário religioso e humano. À pergunta dos dois discípulos, Jesus responde: ”Vinde ver”. O jovem Profeta de Nazaré explica imediatamente; na verdade, não tem nenhuma doutrina para transmitir, mas uma vida para anunciar; por esta razão, propõe imediatamente uma experiência concreta, podemos dizer, uma amizade que se pode tocar e ver. Os dois anota o evangelista - “foram então e viram onde Jesus morava e começaram a viver com Ele naquele mesmo dia; eram mais ou menos quatro horas da tarde”. Ficaram, obviamente em casa de Jesus; mas o que contou deveras foi o estabelecimento dos dois discípulos na companhia do novo Mestre: entraram em comunhão com Ele e ficaram transformados. Ficar com Jesus não exclui, não bloqueia, não reduz os horizontes; pelo contrário, leva a sair do próprio individualismo, a ultrapassar o provincianismo e as próprias mesquinhices para anunciar a todos a descoberta fascinante d’Aquele que é infinitamente maior do que nós, o Messias. A vida dos dois mudou. O encontro com Jesus criou uma nova fraternidade entre André e Pedro. “Encontrámos o Messias”, disse com alegria. Começou também ele a falar como João, indicando a presença de Jesus. A Palavra deve ser anunciada, senão perde-Se. Não acendemos a luz para a deixarmos ficar debaixo do alqueire. Quando a encontramos, induz-nos a dizer: encontrei o futuro, o sentido, a esperança, o que procurava, muito mais do que desejava! Peçamos ao Senhor para nos ensinar a comunicar com paixão a Sua esperança àqueles que procuram o futuro e a salvação; agradeçamo-l’O porque continua a dar-nos a Sua companhia.