V de Páscoa
A Igreja arménia faz memória, no dia de hoje, do massacre sofrido durante a Primeira guerra mundial, onde foram mortos mais de um milhão de arménios.
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Homilia
Depois da ressurreição, os apóstolos e os discípulos encontram Jesus ora no cenáculo, ora no caminho de Emaús, ora no mar de Tiberíades. De certo modo, é o que acontece também connosco, todos os domingos. Reunimo-nos para encontrar o Ressuscitado, aquele mesmo Jesus que tinha dito aos Seus, com uma incrível ternura: "Filhinhos: vou ficar convosco só mais um pouco" (Jo 13, 33). Encontramo-l’O neste nosso tempo, quando muitos consideram ser pouco importante e pouco útil ir ao Seu encontro e escutar a Sua voz. E, no entanto, no coração de todos os homens e mulheres há lágrimas, luto, lamentação e, sobretudo, angústia de viver. Quem se esquece de ir ao encontro d’Aquele que venceu a morte, ressuscitando para a vida, fica sozinho com as suas pobres energias, com os seus pobres sentimentos, ainda que cheios de auto-suficiência; essa pessoa descobrirá bem cedo a fadiga da vida, enquanto que a maior parte da sua humanidade acaba por se apagar. Basta erguer os olhos da nossa própria vida e olhar para outras terras para nos apercebermos de quanta morte, quantos lutos e lamentações ainda existem neste mundo. E não fazemos nada! Poderíamos, pelo menos, gritar mais contra o escândalo de tantas injustiças e prevaricações. Como é que podemos ser assim tão indiferentes, como é que podemos correr com tanta pressa na nossa vida, como que embriagados com os nossos problemas individuais ou nacionais? Como é que se pode viver, discutir, dialogar e enfrentar também a própria vida pública, sem encontrar a dor e a morte, sem sermos impelidos a construir um mundo diferente?
O crente vai ao encontro da Palavra do Ressuscitado e invoca um dia diferente: aquele dia em que não se elevarão mais lamentações porque a morte, com todo o seu poder obscuro, foi derrotada. As coisas velhas ainda são muito fortes; é necessário operar e esperar pelas coisas novas, para que o mal e os seus seguidores deixem de dominar o mundo. Não é um encontro habitual aquele que os irmãos e as irmãs convocam à volta do Ressuscitado. É um momento, grave e exaltante. Naquela noite de quinta-feira da última Ceia, Judas tinha acabado de sair e a atmosfera tinha-se tornado mais serena e familiar: então Jesus deu-lhes o "mandamento novo". Todos os domingos é assim. O mandamento que Jesus nos deu é um mandamento "novo": "Assim como Eu vos amei, também vós deveis amar-vos uns aos outros" (v. 34). "Novo" quer dizer "último", "definitivo", podemos até dizer "único", "fundamental".
Quando à volta do Senhor - aquela mesa que todos os domingos preparamos (mesmo se a deixamos às vezes vazia) - se começam a ouvir essas palavras e se ama (se procura amar) como Ele nos amou, acende-se em nós um amor maior, mais largo, que transcende os nossos confins habituais. Daqui nasce o desejo de um dia diferente, melhor, o desejo do fim de toda a tristeza, de toda a dor, de todo o poder obscuro. Não se pede aos cristãos para construírem a cidade cristã, a cidade santa; no entanto, reunidos à volta do Senhor, ouvimos uma voz que diz: "Esta é a tenda de Deus entre os homens! Ele vai morar com eles. Eles serão o Seu povo e Ele, o Deus-com-eles, será o seu Deus. Ele enxugará as lágrimas dos seus olhos, pois nunca mais haverá morte, nem luto, nem gritos, nem dor. E Aquele que está sentado no trono declarou: "Eis que faço novas todas as coisas" (Ap 21, 3-5).
A aproximação ao Ressuscitado toca-nos e transfigura-nos: o Céu e a Terra nova iniciam quando começamos a amarmo-nos como o Senhor nos amou. Temos então a transfiguração não só de pessoas singulares, mas de um grupo, não interessa se pequeno ou grande. O próprio Jesus tinha dito: "Onde dois ou três estiverem reunidos em Meu nome, Eu estou no meio deles" (Mt 18, 20). E onde vive o Senhor, não vivem as coisas velhas: "Se tiverdes amor uns para com os outros, todos reconhecerão que sois meus discípulos" (Jo 13, 35). Foi, sobretudo, a prática do amor, afirma Tertuliano, a imprimir quase uma marca de fogo aos olhos dos pagãos: "Vede como se amam" diziam (enquanto que eles se odeiam entre si) "e como estão prontos a dar a própria vida pelo próximo" (enquanto que eles preferem matar-se uns aos outros). O mandamento "novo" não é só o distintivo de pertença a Cristo, é o próprio rosto do Senhor ressuscitado que vive naquele pequeno grupo de pobres discípulos que tentam pô-lo em prática.